Quarto da Camilla

Suspirei afastando-me e passei a mão pelo meu cabelo.
-Não fizeste nada, queria que eu ficasse bom e eu estou a ficar bom - virei-me de costas e engoli em seco - agora... - abanei a cabeça e fechei os olhos - eu vou - murmurei indo até à porta.

Continuei de costas mesmo depois de o sentir afastar-se e calei um soluço, fechando os olhos com força. Eu só queria que as coisas voltassem a ficar bem, só queria poder ficar bem com ele, odiava isto.
- Até logo.- murmurei ao fim de algum tempo, olhando-o a ir embora por cima do ombro.

-Até logo - murmurei baixinho, talvez ela nem tivesse ouvido.
Fui até ao estudio, dando a roupa de ontem de novo e fechei os olhos quando me sentei no banco para que me maquilhassem.
-Estás com mau aspecto hoje - disse Li, uma das pessoas que me conhecia melhor ali no meio de tanta gente e também uma das pessoas que me tinha fornecido mais droga. Era dificil estar com ela por perto. Eu encolhi os ombros e ela afastou-se, voltando com um comprimido na mão. - Toma pode ser que acordes - olhei para ele engolindo em seco - então? - aproximou mais a mão, até eu ter que afastar a cabeça.
-Não quero, limita-te a maquilhar-me. - cerrei o maxilar agarrando-me à cadeira.

Olhei-me ao espelho enquanto secava o meu corpo e suspirei baixinho. Eu confiava nele, eu acreditava nele quando me dizia que ia ficar bom, que ia ficar bom por mim, mas o facto de estar sozinho agora, não me saía da cabeça. Eu sabia como era difícil resistir, apesar de eu não consumir, eu tinha visto como tinha sido com os meus pais. Vesti a primeira peça de roupa que encontrei e apanhei o cabelo num rabo de cavalo. Hoje já tinha de ir trabalhar, e apostava que Fly não ia...o que significava que ia estar com outra pessoa..outra pessoa que não ele.

O trabalho foi pouco felizmente, sentia-me cansado demais para ter que trabalhar mais que oito horas, como alguma vez acontecia. Passei as mãos pela cabeça e suspirei enquanto voltava para casa de Camilla, tinha que me comportar e ela tinha razão, se fosse para minha casa, com tanta droga que tinha escondida era capaz de cair em tentação, como quase tinha caído hoje. Abri a porta de casa e olhei em volta à sua procura. Tinha que lhe perguntar a que horas ia hoje, queria estar com ela, não era só por estar sem drogas que deixava de ir.

Ainda tinha uma hora antes de ter de ir trabalhar, ainda tinha tempo. Aproveitei para dar um jeito na casa de banho e no meu quarto e fui depois até à cozinha, onde fiz algo para comer. Sentei-me no balcão enquanto comia e estava perdida nos meus pensamentos quando ouvi a porta abrir-se. Era Fly. Engoli em seco, encolhendo-me ligeiramente na cadeira e olhei para o corredor.
- Estou no corredor.- disse baixinho. Nem sequer sabia se ele me queria ver.

Fui até onde ela disse que estava e sentei-me ao lado dela, passando a mão pelo meu cabelo, desalinhando-o e tentando esquecer o meu dia. -Vais trabalhar a que horas? - perguntei agarrando noutra maçã, estava a morrer de fome. Comecei a comê-la como se nunca tivesse feito isso na vida - eu quero ir.

Engoli em seco ao vê-lo entrar na cozinha e o meu coração disparou só de sentir a sua presença. Endireitei-me no banco e limpei a boca ao guardanapo assim que terminei de comer, bebendo o que restava do meu sumo.
- Tenho de estar lá daqui a uma hora.- murmurei baixinho e olhei-o a comer a maçã.- tens fome? Queres que te prepare alguma coisa? - perguntei, abanando logo a cabeça depois e levantando-me.- eu vou fazer-te qualquer coisa.

Levantei a cabeça quando ela disse que me ia fazer alguma coisa, mas não a impedi, aquilo não me matava a fome que tinha - obrigado - agradeci olhando para ela - posso ir? - eu tinha dito que ia, e que queria ir, mas não sabia se ela realmente me queria lá ou se era melhor ficar em casa.

Acabei por lhe preparar uma salada, por ser a coisa mais rápida e juntei alguns bocadinhos de frango, para ficar mais composta. Pousei o prato à sua frente quando terminei e voltei a sentar-me ao seu lado, ficando a brincar com os meus dedos.
- Se quiseres ir.- encolhi os ombros.- eu não mando em ti.- murmurei baixinho.

Mordi o lábio enquanto olhava para a salada e não a consegui começar a comer sem antes perguntar-lhe agora mais.
-Queres estar com outra pessoa lá, que não seja eu? - perguntei levantando o olhar para os seus olhos.

Agarrei no pano que estava sob o balcão e brinquei com ele por entre os meus dedos, voltando depois a pousá-lo, estava demasiado nervosa para conseguir parar quieta. Passei as mãos pelo cabelo e mal ouvi a sua pergunta, abanei a cabeça, quase de forma imediata.
- Não.- murmurei.- é claro que não quero.- mordi o lábio.- mas tu é que podes já não querer estar comigo..- encolhi os ombros.

Aproximei a minha cadeira da dela, apesar de não parecer, sentia-me a pessoa mais frágil do mundo. - Eu quero estar contigo - murmurei agarrando na sua mão, colocando a minha fome de lado. - Não quero ver-te com mais ninguém - admiti olhando para a minha salada - dá-me voltas ao estômago só de pensar.

Olhei a sua mão na minha e acabei por entrelaçar os meus dedos nos seus, sentindo o meu queixo tremer.
- Eu também não quero estar com mais ninguém.- murmurei baixinho, respirando fundo para não chorar.- não quero que mais ninguém me toque como tu, não quero mais ninguém.- abanei a cabeça e apertei a sua mão.- desculpa-me...- olhei-o com os olhos inundados de lágrimas.- desculpa o que eu te fiz, eu não devia..- funguei.- mas eu preocupo-me tanto contigo.- as lágrimas acabaram por começar a correr.- desculpa..- baixei o olhar.

Suspirei quando vi o seu queixo tremer e os seus olhos inundados de lágrimas. Aproximei mais a cadeira da sua, puxando-a para mim e abracei-a com força, dando-lhe festinhas no cabelo, descendo pelas suas costas - não precisas de pedir - murmurei - Está tudo bem - disse baixinho - eu vou contigo.

Soltei um soluço mais aflito quando me puxou para ele e escondi imediatamente a cara no seu pescoço, agarrando-me a ele.
- Eu não quero que te afastes de mim.- solucei.- não quero que fiques chateado.- abanei a cabeça.- eu não fiz por mal.- sussurrei.

-Mas já te disse que está tudo bem - suspirei passando a mão pelo seu cabelo enquanto a abraçava, ela estava mesmo com medo e não a podia julgar, se fosse antes e ela fosse outra pessoa, o mais provável era não a conseguir perdoar. - Acalma-te - pedi-lhe afastando-me um bocado, precisava de comer.

Senti o meu coração apertar-se quando se afastou de mim, mas não disse nada, ele tinha de comer. Funguei baixinho, assentindo com a cabeça e fiquei a fazer desenhos imaginários sobre o balcão.
- Sempre queres vir comigo? - perguntei baixinho.

Agarrei apenas no garfo, comendo toda a salada em segundos e apesar de ainda ter fome não disse nada, ficando a olha-la depois da sua pergunta. - Quero - murmurei - não tens que ir? - perguntei esticando-me até mais uma maçã, começando a comê-la.

Olhei-o a comer e quando terminou, mordi o lábio, se calhar devia ter feito mais qualquer coisa. Soltei um suspiro ao olhar para as horas e mesmo que quisesse, já não tinha mais tempo.
- Ainda tens fome, não tens? - murmurei baixinho e assenti com a cabeça à sua pergunta.- tenho.- engoli em seco e levantei-me devagarinho.

Encolhi os ombros quando me perguntou se ainda tinha fome, não queria dizer nada, eu sabia bem o que era isto. Assenti assim que ela levantou e fiz o mesmo, não queria ir sozinho.
-Eu vou contigo - agarrei-lhe na mão, ficando a olha-la - se quiseres - murmurei - é que... - olhei para o chão e encolhi os ombros. Ele ia estar lá, eu sabia que ia, e ia oferecer-me mais, eu... não ia.. ia sim.

- Eu posso fazer-te qualquer coisa num instante, queres? - entrelacei os meus dedos nos seus e olhei-o também.- eu quero.- murmurei no mesmo tom que ele. Juntei as sobrancelhas quando pareceu ficar mais preocupado e levantei-lhe o olhar, fazendo com que olhasse para mim.- é que..? - pedi que continuasse, apertando-lhe ligeiramente a mão.

-Não é preciso nada, estou bem.
Levantei o olhar quando ela o levantou, fazendo-me olha-la e engoli em seco encolhendo os ombros - nada, deixa-me ir contigo - pedi-lhe apertando uma das suas mãos - eu fico num canto, prometo que ninguém nota que estou lá.

Olhei os seus olhos com atenção e deslizei um dedo pela sua bochecha, suspirando baixinho.
- Quem é que está lá que tu não queres ver? Ou o quê? - murmurei e quando me pediu que o deixasse ir comigo, eu apenas assenti.- eu deixo, eu..- suspirei.- não quero ter de estar com os outros.- encolhi-me.

Ignorei a sua outra pergunta, não queria falar com ela sobre isso. Passei as mãos pelo cabelo e comecei a andar de mão dada com ela, não queria que se atrasasse por minha causa. - Não vais estar com os outros, o teu patrão gosta de dinheiro, eu tenho dinheiro, mais do que os outros, vou ficar contigo, eu não me importo de pagar por isso.